A capoeira é uma expressão cultural brasileira que mistura arte-marcial, desporto, cultura popular e música.
Desenvolvida no Brasil principalmente por descendentes de escravos africanos , é caracterizada por golpes e movimentos ágeis e complexos, utilizando primariamente chutes e rasteiras, além de cabeçadas, joelhadas, cotoveladas, acrobacias em solo ou aéreas.
Uma característica que distingue a capoeira da maioria das outras artes marciais é a sua musicalidade. Praticantes desta arte marcial brasileira aprendem não apenas a lutar e a jogar, mas também a tocar os instrumentos típicos e a cantar. Um capoeirista experiente que ignora a musicalidade é considerado incompleto.
A palavra capoeira é originária dotupi.guarani, que significa "o que foi mata", através da junção dos termos ka'a ("mata") e pûer ("que foi")1 . Refere-se às áreas de mata rasteira do interior do Brasil onde era praticada agricultura indígena. Acredita-se que a capoeira tenha obtido o nome a partir destas áreas que cercavam as grandes propriedades rurais de base escravocrata. Capoeiristas fugitivos da escravidão e desconhecedores do ambiente ao seu redor, frequentemente usavam a vegetação rasteira para se esconderem da perseguição dos capitães-do-mato.
Outras expressões culturais, como o maculelê e o samba de roda, são muito associadas à capoeira, embora tenham origem e significados diferentes.
História:
A história da capoeira provavelmente começa com o início da escravidão africana no Brasil. A partir do século XVI, Portugal começou a enviar escravos para as suas colónias, provenientes primariamente da África Ocidental.
O Brasil, com seu vasto território, foi o maior receptor da migração de escravos, com quase quarenta por cento de todos os escravos enviados através do Oceano Atlântico. Os povos mais frequentemente vendidos no Brasil faziam parte dos grupos sudanês (composto principalmente pelos povos Iorubá e Daomé), guineo-sudanês, dos povos Malesi e Hausa e do grupo banto (incluindo os kongos, os Kimbundos e os Kasanjes), provenientes dos territórios localizados atualmente em Angola, Congo e Moçambique.
A capoeira ainda é motivo de controvérsia entre os estudiosos de sua história, sobretudo no que se refere ao período compreendido entre o seu surgimento e o início do século XIX, quando aparecem os primeiros registos confiáveis com descrições sobre sua prática.
Origem:
No século XVI, Portugal tinha um dos maiores impérios coloniais da Europa, mas carecia de mão de obra para efectivamente colonizá-lo. Para suprir este défice os colonos portugueses, no Brasil, tentaram, no início, capturar e escravizar os povos indígenas, algo que logo se demonstrou impraticável. A solução foi o tráfico de escravos africanos.
A principal actividade económica colonial do período era o cultivo da cana-de-açúcar. Os colonos portugueses estabeleciam grandes fazendas, cuja mão de obra era primariamente escrava. O escravo, vivendo em condições humilhantes e desumanas, era forçado a trabalhar à exaustão, frequentemente sofrendo castigos e punições físicas. Mesmo sendo em maior número, a falta de armas, a lei vigente, a discordância entre escravos de etnias rivais e o completo desconhecimento da terra em que se encontravam desencorajavam os escravos a rebelar-se.
Neste meio, começou a nascer a capoeira. Mais do que uma técnica de combate, surgiu como uma esperança de liberdade e de sobrevivência, uma ferramenta para que o negro foragido, totalmente desequipado, pudesse sobreviver ao ambiente hostil e enfrentar a caça dos capitães-do-mato, sempre armados e montados a cavalo.
Nos quilombos:
Não tardou para que grupos de escravos fugitivos começassem a estabelecer assentamentos em áreas remotas da colónia, conhecidos como quilombos. Inicialmente assentamentos simples, alguns quilombos evoluíam atraindo mais escravos fugitivos, indígenas ou até mesmo europeus que fugiam da lei ou da repressão religiosa católica, até tornarem-se verdadeiros estados multiétnicos independentes.
A vida nos quilombos oferecia liberdade e a oportunidade do resgate das culturas perdidas à causa da opressão colonial. Neste tipo de comunidade formada por diversas etnias, constantemente ameaçada pelas invasões portuguesas, a capoeira passou de uma ferramenta para a sobrevivência individual a uma arte marcial com escopo militar.
O maior dos quilombos, o Quilombo dos Palmares, resistiu por mais de cem anos aos ataques das tropas coloniais. Mesmo possuindo material bélico muito aquém dos utilizados pelas tropas coloniais e geralmente combatendo em menor número, resistiram a, pelo menos, 24 ataques de grupos com até 3 000 integrantes comandados por capitães do mato. Foram necessários dezoito grandes ataques de tropas militares do governo colonial para derrotar os quilombolas. Soldados portugueses relataram ser necessário mais de um dragão (militar) para capturar um quilombola, porque se defendiam com estranha técnica de ginga e luta. O governador-geral da Capitania de Pernambuco declarou ser mais difícil derrotar os quilombolas do que os invasores holandeses.
A urbanização:
Com a transferência do então príncipe-regente dom João VI e de toda a corte portuguesa para o Brasil em 1808, devido à invasão de Portugal por tropas napoleónicas, a colónia deixou de ser uma mera fonte de produtos primários e começou finalmente a se desenvolver como nação.
Com a subsequente abertura dos portos a todas as nações amigas, o monopólio português do comércio colonial efectivamente terminou. As cidades cresceram em importância e os brasileiros finalmente receberam permissões para fabricar no Brasil produtos antes importados, como o vidro.
Já existiam registros da prática da capoeira nas cidades de Salvador, Rio de Janeiro e Recife desde o século XVIII, mas o grande aumento do número de escravos urbanos e da própria vida social nas cidades brasileiras deu à capoeira maior facilidade de difusão e maior notoriedade.
No Rio de Janeiro, as aventuras dos capoeiristas eram de tal jeito que o governo, através da portarias como a de 31 de Outubro de 1821, estabeleceu castigos corporais severos e outras medidas de repressão à prática de capoeira.
Libertação dos Escravos e Proibição
No fim do século XIX, a escravidão no Brasil era basicamente impraticável por diversos motivos, entre eles o sempre crescente número das fugas dos escravos e os incessantes ataques das milícias quilombolas às propriedades escravocratas. O império Brasileiro tentou amenizar os diversos problemas com medidas como a lei dos Sexagenários e a lei do Ventre Livre, mas o Brasil invevitavelmente reconheceria o fim da escravidão em 13 de maio de 1888 com a lei Áurea, sancionada pelo parlamento e assinada pela princesa Isabel.
Livres, os negros viram-se abandonados à própria sorte. Em sua grande maioria, não tinham onde viver, onde trabalhar e eram desprezados pela sociedade, que os via como vagabundos. O aumento da oferta de mão de obra europeia e asiática do período diminuía ainda mais as oportunidades e logo grande parte dos negros foi marginalizada e, naturalmente, com eles a capoeira.
Foi inevitável que diversos capoeiristas começassem a utilizar suas habilidades de formas pouco convencionais. Muitos começaram a utilizar a capoeira como guardas de corpo, mercenários, assassinos de aluguel, capangas. Grupos de capoeiristas conhecidos como maltas aterrorizavam o Rio de Janeiro. Em pouco tempo, mais especificamente em 1890, a República Brasileira decretou a proibição da capoeira em todo o território nacional, vista a situação caótica da capital brasileira e a notável vantagem que um capoeirista levava no confronto corporal contra um policial.
Devido à proibição, qualquer cidadão pego praticando capoeira era preso, torturado e muitas vezes mutilado pela polícia. A capoeira, após um breve período de liberdade, via-se mais uma vez malvista e perseguida. Expressões culturais como a roda de capoeira eram praticadas em locais afastados ou escondidos e, geralmente, os capoeiristas deixavam alguém de sentinela para avisar de uma eventual chegada da polícia.
A Luta Regional Baiana
Em 1932, um período em que a perseguição à
capoeira já não era tão acentuada, mestre Bimba, exímio lutador no ringue e em lutas de rua
ilegais, fundou em Salvador a primeira academia de capoeira da história.
Bimba, ao analisar o modo como diversos capoeiristas utilizavam suas
habilidades para impressionar turistas, acreditava que a capoeira estaria
perdendo sua eficiência como arte marcial. Dessa forma, Bimba, com auxílio de
seu aluno José Cisnando Lima, enxugou a capoeira, tornando-a mais
eficiente para o combate e inseriu alguns movimentos de outras artes marciais,
como o batuque. Mestre Bimba também desenvolveu um dos primeiros métodos de
treinamento sistemático para a capoeira. Como a palavra capoeira ainda era
proibida pelo código Penal, Bimba chamou seu novo estilo de Luta
Regional Baiana.
Em 1937, Bimba fundou o centro de
Cultura Física e Luta Regional, com alvará da secretaria da Educação, Saúde e
Assistência de Salvador. O seu trabalho obteve aceitação social, passando a
ensinar para as elites económicas, políticas, militares e universitárias.
Finalmente, em 1940, a capoeira saiu do código Penal brasileiro e
deixou definitivamente a ilegalidade. Começou, então, um longo processo de
desmarginalização da capoeira.
Em pouco tempo a notoriedade da capoeira
de Bimba demonstrou ser um incómodo aos capoeiristas tradicionais, que perdiam
espaço e continuavam a ser malvistos. Esta situação desigual começou a mudar
com a inauguração do Centro Esportivo de Capoeira Angola, em 1941, por mestre
Pastinha. Localizado no Pelourinho, em Salvador, o centro atraía
diversos capoeiristas que preferiam manter a capoeira em sua forma mais
original possível. Em breve, a notoriedade do centro cunhou em definitivo o
termo "capoeira angola" como nome do estilo tradicional de capoeira.
O termo não era novo, sendo, já na época do império, a prática da
capoeira apelidada, em alguns locais, de "brincar de angola" e
diversos outros mestres que não seguiam a linha de Pastinha acabaram
adotando-o.
Actualmente
Hoje em dia, a capoeira se tornou não
apenas uma arte ou um aspecto cultural, mas uma verdadeira exportadora da
cultura brasileira para o exterior. Presente em dezenas de países em todos os
continentes, todo ano a capoeira atrai ao Brasil milhares de alunos
estrangeiros e, frequentemente, capoeiristas estrangeiros se esforçam em
aprender a língua portuguesa num esforço para melhor se envolver com a arte.
Mestres e contra-mestres respeitados são constantemente convidados a dar aulas
especiais no exterior ou até mesmo a estabelecer seu próprio grupo.
Apresentações de capoeira, geralmente administradas em forma de espetáculo,
acrobáticas e com pouca marcialidade, são realizadas no mundo inteiro.
O aspecto marcial ainda se faz muito
presente e, como nos tempos antigos, ainda é sutil e disfarçado. A malandragem
é sempre presente, capoeiristas experientes raramente tiram os olhos de seus
oponentes em um jogo de capoeira, já que uma queda pode chegar disfarçada até
mesmo em um gesto amigável.
Símbolo da cultura afro-brasileira, símbolo
da miscigenação de etnias, símbolo de resistência à opressão, a capoeira mudou
definitivamente sua imagem e se tornou fonte de orgulho para o povo brasileiro.
Atualmente, é considerada património Cultural e material do Brasil.
Roda de capoeira


Em geral, o objetivo do jogo da capoeira
não é o nocaute ou destruir o oponente. O maior objetivo do capoeirista ao
entrar em uma roda é a queda, ou seja, derrubar o oponente sem ser
golpeado, preferencialmente com uma rasteira. Na maioria das vezes, entre o
jogo de um capoeirista mais experiente e um novato, o capoeirista experiente
prefere mostrar sua superioridade marcando o golpe no
oponente, ou seja, freando o golpe um instante antes de completá-lo. Entre dois
capoeiristas experientes o jogo poderá ser muito mais agressivo e as
consequências mais graves.
A ginga é o movimento básico da
capoeira, mas além da ginga são muito comuns os chutes em rotação, rasteiras,
floreios (como o aú ou a bananeira), golpes com as mãos, cabeçadas, esquivas,
acrobacias (como o salto mortal), giros apoiados nas mãos ou na cabeça e
movimentos de grande elasticidade.
O baptizado
O batizado é uma roda
de capoeira solene e festiva, onde alunos novos recebem sua primeira
corda e demais alunos podem passar para graduações superiores. Em algumas
ocasiões pode-se ver formados e professores recebendo graduações avançadas,
momento considerado honroso para o capoeirista.
O batizado parte ao
comando do capoeirista mais graduado do grupo, seja ele mestre, contramestre ou professor.
Os alunos jogam com um capoeirista formado e devem tentar se defender.
Normalmente o jogo termina com a queda do aluno, momento em
que é considerado batizado, mas o capoeirista formado pode julgar
a queda desnecessária. No caso de alunos mais avançados, o
jogo poderá ser com mais de um formado, ou até mesmo com todos os formados
presentes, para as graduações avançadas.
O apelido
Tradicionalmente o batizado seria
o momento em que o capoeirista recebe ou oficializa seu apelido, ou
nome de capoeira. A maioria dos capoeiristas passa a ser conhecida na
comunidade mais pelos seus respectivos apelidos do que por seus próprios nomes.
Apelidos podem surgir de inúmeros motivos, como uma característica física, uma
particular habilidade ou dificuldade, uma ironia, a cidade de origem, etc.
O costume do apelido surgiu
na época em que a capoeira era ilegal. Capoeiristas evitavam dizer seus nomes
para evitar problemas com a polícia e se apresentavam a outros capoeiristas ou
nas rodas pelos seus apelidos. Dessa forma um capoeirista não
poderia revelar os nomes dos seus companheiros à polícia, mesmo que fosse preso
e torturado.
Hoje em dia o apelido continua
uma forte tradição na capoeira, apesar de não ser mais necessário.
Música
A música é um componente fundamental da
capoeira. Foi introduzida como forma de ludibriar os escravizadores, fazendo-os
acreditar que os escravos estavam dançando e cantando, quando na verdade
estavam desenvolvendo e treinando uma arte-marcial para se defenderem.
Componente fundamental de uma roda de capoeira, ela determina o
ritmo e o estilo do jogo que é jogado. A música é criada pela bateria e
pelo canto (solista ou em coro), geralmente acompanhados de um bater de palmas.
A bateria é tradicionalmente
composta por três berimbaus, dois pandeiros e um atabaque, mas o formato pode
variar excluindo-se ou incluindo-se algum instrumento, como o agogô e o ganzuá.
Um dos berimbaus define o ritmo e o jogo de capoeira a ser desenvolvido na
roda. Desta maneira, é a música que comanda a roda de capoeira, não só no ritmo
mas também no conteúdo.
Canções
As canções de capoeira são
divididas em partes solistas e respostas do coro, formado por todos os demais
capoeiristas presentes naroda. Dependendo do seu conteúdo podem ser
classificadas como ladainhas, chulas, corridos ou quadras.
A ladainha, ou lamento, é
utilizada unicamente no início da roda de capoeira. Parte do longo
grito iê, seguido de uma narrativa solista cantada em tom solene.
Geralmente é cantada pelo capoeirista mais respeitado ou graduado da roda.
Neste momento não existe jogo, não se bate palmas e alguns instrumentos não
são tocados. A narrativa é seguida pelas homenagens tradicionais feitas pelo
solista (a Deus, ao seu mestre, a quem o ensinou e mais qualquer personagem
importante ou fator relevante à capoeira, como a malandragem), respondidas
intercaladamente pela louvação do coro e pelo início das
palmas e dos instrumentos complementares. O jogo de
capoeirasomente pode iniciar após o fim da ladainha.
A chula é um canto em que
a parte solista é muito mais longa do que a a resposta do coro. Enquanto o
solista canta dez, doze, ou até mais versos, o coro responde com apenas dois ou
quatro versos. A chula pode ser cantada em qualquer momento
da roda.
O corrido, forma musical mais
comum da roda de capoeira, é um canto onde a parte solista e a
resposta do coro são equivalentes, em alguns casos o número de versos do coro
superando os versos solistas. Pode ser cantado em qualquer momento da roda e
seus versos podem ser modificados e improvisados durante o jogo para refletir o
que está acontecendo durante a roda, ou para passar algum aviso a um dos demais
capoeiristas.
A quadra é composta de um
mesmo verso repetido quatro vezes, seja três versos solistas e uma resposta do
coro, seja a parte solista e a resposta intercaladas. Pode ser cantada em
qualquer momento da roda.
As canções de capoeira têm assuntos dos
mais variados. Algumas canções são sobre histórias de capoeiristas famosos,
outras podem falar do cotidiano da comunidade. Algumas canções comentam o que
está acontecendo durante a roda de capoeira, outras divagam sobre a vida ou um
amor perdido. Outras ainda são alegres e falam de coisas tolas, cantadas apenas
por diversão. Basicamente não existem regras e alunos são encorajados a criar suas
próprias canções.
Os capoeiristas mudam as canções
frequentemente de acordo com o que ocorre na roda ou fora dela. Um bom exemplo
é quando um capoeirista novato demonstra notável habilidade durante o jogo e o
solista canta o verso "e o menino é bom", seguido pelo coro com o
verso "bate palma pra ele". A letra da música é constantemente usada
para passar mensagens para um dos capoeiristas, na maioria das vezes de maneira
velada e sutil.
Toques de capoeira
O toque de capoeira é o
ritmo tocado pelos berimbaus, seguidos pelos demais instrumentos. Podem ser
executados desde bem lentamente (como no toque de Angola),
induzindo a um jogo mais lento e estratégico, até bastante acelerados (como
em São Bento Grande), induzindo a um jogo rápido, ágil e
acrobatico. Podem também ter outros significados que vão além do jogo ou
comandar umaroda restrita, como o toque de Iúna.
Em uma roda de capoeira a
forma mais usual é iniciar com o toque de Angola e subir o
ritmo gradualmente, encerrando com o toque São Bento Grande em
alta velocidade. Contudo não existem regras, uma roda pode
manter sempre o mesmo toque ou mesmo inverter, começando de modo acelerado e
terminando de modo lento.
Alguns dos toques mais comumente
utilizados:
- Toque de Angola
- · São Bento Pequeno
- · São Bento Grande de Angola
- · São Bento Grande da Regional
- · Iúna
- · Cavalaria
- · Samango
- · Santa Maria
- · Benguela
- · Amazonas
- · Idalina
A dança e a
capoeira
Devido à sua origem e história, existiu
sempre a necessidade de se esconder ou disfarçar o aprendizado e a prática da
capoeira. Na época da escravidão era um risco enorme aos senhores de engenho possuir
escravos hábeis em uma arte-marcial. Para evitar represálias por parte de seus
senhores, os escravos praticavam enquanto seus companheiros cantavam e batiam
palmas. Os golpes e esquivas eram praticados durante uma falsa dança que seria
o embrião da actual ginga.
Da falsa dança da época dos engenhos de
açúcar até os tempos mais atuais, a ginga evoluiu até se tornar uma estratégia
de combate, cujo objetivo principal é não oferecer ao oponente um alvo fixo.
Mesmo hoje em dia a maioria dos leigos à primeira vista acredita tratar-se a
capoeira de uma coreografia, ou de uma dança acrobática.
Outras manifestações culturais como o
batuque, o maculele, a puxada de rede e o samba de roda são danças fortemente
ligadas à capoeira, por também terem nascido da mesma cultura.
Estilos
Falar sobre estilos na capoeira é um
argumento difícil, visto que nunca existiu uma unidade na capoeira original, ou
um método de ensino antes da década de 1920. De qualquer forma a divisão entre
dois estilos e um sub-estilo é amplamente aceita.
Angola
Capoeira Angola refere-se a toda a
capoeira que mantém as tradições da época anterior à da criação do estilo
Regional. Em outras palavras é a capoeira mais tradicional. Existindo em
diversas áreas do país desde tempos mais remotos, notadamente no Rio de
Janeiro, em Salvador e em Recife, é
impossível precisar onde e quando a capoeira Angola começou a tomar sua forma
atual.
O nome "Angola" já começa a
aparecer com os negros que vinham para o Brasil oriundos da África, embarcados
no Porto de Luanda que, independente de sua origem, eram designados na chegada
ao Brasil de negros de Angola. Em alguns locais a população se
referia ao jogo de capoeira como brincar de Angola e,
de acordo com Mestre Noronha, o Centro
de Capoeira Angola Conceição da Praia, criado pela nata da capoeiragem
baiana, já utilizava ilegalmente o nome capoeira Angola no
início da década de 1920.
O nome Angola foi
finalmente imortalizado por Mestre Pastinha, ao inaugurar em 23 de Fevereiro de
1941 o Centro Esportivo de capoeira Angola (CECA). Pastinha foi
conhecido como grande defensor da capoeira tradicional,
prestigiadíssimo por capoeiristas de renome como Mestre João Grande e Mestre
Moraes. Com o tempo, diversos outros grupos de capoeira tradicional passaram
a adotar o nome Angola para seus estilos.
A Angola é o estilo mais próximo de como
os escravos lutavam ou jogavam a capoeira. Caracterizada por ser
estratégica, com movimentos furtivos executados perto do solo ou em pé
dependendo da situação a enfrentar, ela enfatiza as tradições da malícia, da
malandragem e da imprevisibilidade da capoeira original.
Alguns angoleiros afirmam que seu domínio é muito complicado,
envolvendo não só a parte mecânica do jogo mas também características como
sutileza, o subterfúgio, a dissimulação, a teatralização, a mandinga ou mesmo a
brincadeira para superar o oponente.
A bateria típica em
uma roda de capoeira Angola é composta por
três berimbaus, dois pandeiros, um atabaque, um agogo e um ganzua.
Regional
A capoeira regional começou a nascer na
década de 1920, do encontro de mestre Bimba com seu futuro aluno,
José Cisnando Lima. Ambos acreditavam que a capoeira estaria perdendo seu valor
marcial e chegaram à conclusão de que uma reestruturação era necessária. Bimba
criou, então, sequências de ensino e metodizou o ensino de capoeira.
Aconselhado por Cisnando, Bimba chamou sua capoeira de Luta Regional
Baiana, visto que a capoeira ainda era ilegal na época.
A base da capoeira regional é
a capoeira tradicional mais enxuta, com menos subterfúgios e maior
objetividade. O treinamento era mais focado no ataque e no contra-ataque, com
muita importância para a precisão e a disciplina. Bimba também incorporou
alguns golpes de outras artes marciais, notadamente o batuque, antiga luta de rua praticada por seu pai. O
uso de acrobacias e saltos era mínimo: um dos fundamentos era sempre manter ao
menos uma base de apoio. Como dizia Mestre Bimba, o chão é amigo do
capoeirista.
A capoeira regional também
introduziu na capoeira o conceito de graduações. Na academia de mestre Bimba,
existiam três níveis hierárquicos: calouro, formado e formado especializado. As
graduações eram determinadas por um lenço amarrado na cintura.
As tradições da roda e do jogo de capoeira
foram mantidas, servindo para a aplicação das técnicas aprendidas em aula. A
bateria, contudo, foi modificada, sendo composta por um único berimbau e dois
pandeiros. Uma das maiores honras para um discípulo era a permissão para jogar
júna. O jogo de iúna tinha a função simbólica de promover a demarcação do
grupo dos formados para o grupo dos calouros.
A única peculiaridade técnica do jogo de
iúna em relação aos jogos realizados em outros momentos da roda de capoeira era
a obrigatoriedade da aplicação de um golpe pré-estabelecido no desenrolar do
jogo. O jogo também destacava-se pela maior habilidade dos capoeiristas que o
executavam. O jogo de iúna era praticado apenas ao som do berimbau, sem palmas
ou outros instrumentos, o que reforçava seu caráter solene. Ao final de cada
jogo, todos os participantes aplaudiam os capoeiristas que saíam da roda.
A luta regional baiana tornou-se
rapidamente popular, levando a capoeira ao grande público e finalmente mudando
a imagem do capoeirista, tido no Brasil até então como um marginal. Das muitas
apresentações que mestre Bimba fez com seu grupo, talvez a mais conhecida tenha
sido a ocorrida em1953 para o então presidente da república Getúlio
Vargas, ocasião em que teria ouvido do presidente: A capoeira é o
único esporte verdadeiramente nacional.
Capoeira contemporânea
A partir da década de 1970 um estilo
misto começou a adquirir notoriedade, com alguns grupos unindo os fatores que
consideravam mais importantes da Regional e da Angola.
Notadamente mais acrobático, este estilo misto é visto por alguns como a evolução
naturalda capoeira, por outros como descaracterização ou até mesmo
mal-interpretação das tradições capoeirísticas.
Com o tempo toda capoeira que não seguia
as linhas da Regional ou da Angola, mesmo as
amalgamadas com outras artes-marciais, passou a se denominar Contemporânea.
Golpes e movimentos
A capoeira usa primariamente os pés
como ataque. Golpes podem ser diretos, como no caso do
Martelo, ou giratórios, como no caso da
Meia-lua de compasso. A rasteira é de
suma importância, considerada por muitos como a melhor arma disponível para o
capoeirista. Desenvolvida para o combate em desvantagem, o ataque do
capoeirista deve ser aplicado no momento oportuno e de forma definitiva.
A defesa usa o princípio
da não-resistência, isto é, evitar um golpe com uma esquiva em
vez de apará-lo. Esquivas podem ser executadas tanto em pé quanto com os apoios
das mãos no chão. No caso de impossibilidade da esquiva o Capoeirista se
defende aparando ou desviando o golpe com as mãos ou as pernas.
A ginga é importantíssima para a defesa e
para o ataque do capoeirista, tornando o capoeirista
imprevisível durante o ataque e dificultando um possível contra-ataque, além de
evitar que o capoeirista se torne um alvo fixo.
Completam a técnica as cabeçadas, floreios
(acrobacias no solo), tesouras, cotoveladas e outras.
Graduação
Devido à sua vastidão e à sua origem, a
capoeira nunca teve unidade ou consenso. O sistema de graduação segue
o mesmo caminho, nunca tendo existido um sistema padrão que fosse aceito pela
maioria dos grandes mestres. Dessa forma o sistema de
graduação varia muito de grupo para grupo. A própria origem do sistema é
recente, tendo partido com a Luta Regional Baiana de Mestre
Bimba, na década de 1930. Bimba utilizava lenços de seda para diferenciar seus
alunos entre aluno formado, aluno especializado e mestre.
Alunos novos não possuiam graduação.
Atualmente o sistema de graduação mais
comum é o de cordas (também chamadas cordéis ou cordões) de diferentes
colorações amarrados na cintura do jogador. Alguns grupos usam diferentes
sistemas, ou até mesmo nenhum sistema.
Existem várias entidades (Ligas,
Federações e Confederações) que tentam organizar e unificar a graduação na
capoeira. O sistema mais comum é o da Confederação Brasileira de Capoeira, que adota o sistema de graduação feito
por cordas seguindo as cores da bandeira brasileira, de fora
para dentro (iniciado na época em que a capoeira oficialmente era considerada
parte da Federação Brasileira de Pugilismo).
Apesar de muito difundido com diversas
variações, muitos grupos grandes e influentes utilizam cores diferentes ou mesmo
graduações diferentes. A própria Confederação Brasileira de Capoeira não
é amplamente aceita como representante principal da capoeira.
Sistemas de graduação
1) Confederação Brasileira de Capoeira Graduação
básica adulta (a partir de 15 anos)
·
Iniciante: sem corda ou cordão
·
Batizado: verde
·
Graduado: amarelo
·
Avançado: azul
·
Intermediário: verde e amarelo
·
Adiantado: verde e azul
·
Estagiário: amarelo e azul
Graduação avançada - Docente de capoeira
·
Formado: verde, amarelo e azul - 5 anos de capoeira - idade mínima 18 anos
·
Monitor: verde e branco - 7 anos de capoeira - idade mínima 20 anos
·
Instrutor: amarelo e branco - 12 anos de capoeira - idade mínima 25 anos
·
Contramestre: azul e branco - 17 anos de capoeira - idade mínima 30 anos
·
Mestre: branco - 22 anos de capoeira - idade mínima 35 anos
2) Outro sistema
Sistema mais comumente usado por muitos
grupos regularizados, porém não-filiados por opção à Confederação Brasileira de
Capoeira por variadas razões. Este sistema utiliza as cores primárias e
secundárias, sendo as misturas de cores nas cordas descritas como
"Transformações", ou seja, simbolizando a saída de uma graduação e ingresso
à outra seguinte.
·
Iniciante: sem corda ou cordão
·
Batizado: Crua (não leva tinta ou coloração)
·
Graduado Iniciante: Crua e Amarela
·
Graduado: Amarela
·
Intermediário: Amarela e Laranja
·
Adiantado: Laranja
·
Estagiário: Laranja e azul
Graduação avançada - Docente de capoeira
·
Formado: Azul - 5 anos de capoeira - idade mínima 18 anos
·
Monitor em Formação: Azul e Verde - 7 anos de capoeira - idade mínima 18
anos
·
Monitor: Verde - 7 anos de capoeira - idade mínima 20 anos
·
Instrutor em Formação: Verde e Roxa - 12 anos de capoeira - idade mínima 23
anos
·
Instrutor: Roxa - 12 anos de capoeira - idade mínima 25 anos
·
Professor: Roxa e Marrom - 17 anos de capoeira - idade mínima 28 anos
·
Contra-mestre: Marrom - 17 anos de capoeira - idade mínima 30 anos
·
Mestrando: Marrom e Vermelha - 20 anos de capoeira - idade mínima 33 anos
·
Mestre: Vermelha - 22 anos de capoeira - idade mínima 35 anos
·
Grão-Mestre: Branca - 36 anos de capoeira e pelo menos 18 anos como mestre
- idade mínima 55 anos
Graduação infantil (até 14 anos) — idêntica à
graduação básica, porém metade da corda possui a cor cinza. A graduação
infantil restringe-se até a graduação de estagiário. Para que o aluno se gradue
como docente de capoeira deve atingir a idade mínima de 18 anos. O tempo de
cada graduação varia conforme sua importância. As cordas iniciais, como a verde
e a amarela, podem ser conquistadas em menos de um ano; por outro lado, chegar
às cordas avançadas, notadamente as de contra-mestre e mestre,
pode levar anos, e exige-se profundo conhecimento da capoeira para
serem conquistadas — esse conhecimento, no entanto, não quer dizer saltos ou
acrobacias, mas conhecimento instrumental, teórico, prática de docência,
qualidade de jogo, respeito, cursos de aperfeiçoamento e boa índole pessoal são
alguns dos requisitos básicos para tais graduações.
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